Durante o tratamento de câncer, Jaqueline Monteiro Alves, de 30 anos, recebeu uma surpreendente notícia: ela estava grávida. Ela mora em Castilho, interior de São Paulo, e precisava se deslocar quase todos os dias para Araçatuba, a cerca de 126 km de distância, para as intervenções médicas. Durante uma dessas consultas, Jaqueline, que já era mãe de dois pares de gêmeos, descobriu que esperava trigêmeos.
Os bebês, chamados Derriane, Miguel e Benício, nasceram prematuros e passaram os primeiros dias de suas vidas na UTI da Santa Casa de Araçatuba. Atualmente, já estão em casa com a família, enquanto Jaqueline aguarda para retomar o tratamento contra o câncer. Em uma entrevista ao VivaBem, ela compartilhou como sua vida mudou repentinamente e como, após dar à luz, encontrou um novo propósito para sua jornada.
Minha experiência inicial com a gravidez foi com o nascimento das minhas duas filhas, que agora têm 10 anos. Tudo transcorreu tranquilamente, levando a gestação até o final e o parto ocorreu sem complicações. Em seguida, tive dois filhos, que hoje têm 5 anos. Mais uma vez, foi uma gravidez normal e dei à luz quando eles já tinham 9 meses.
Inicialmente, não tinha planos de ter mais filhos, até que, no ano passado, descobri que estava grávida de trigêmeos há cinco meses – ao mesmo tempo em que estava passando por um tratamento contra o câncer.
A descoberta do câncer ocorreu em novembro de 2021. Naquela época, eu trabalhava no serviço público da cidade e percebi que tinha surgido um pequeno nódulo no meu peito. Ele era facilmente visível e começou a me causar desconforto. Sentia muita dor e notei que estava inflamando e aumentando de tamanho, o que me levou a procurar um médico.
Ao chegar à clínica, o médico me disse: “Vou realizar um exame em você, mas já tenho uma ideia do que pode ser”. Naquele momento, eu tinha outros planos para mim e para minha família. Queria iniciar o processo para obter minha habilitação de condução, mas nada saiu como planejado. Após os exames, o médico confirmou que eu tinha câncer de mama.
Iniciei o tratamento e foi um período muito intenso. Tive que parar de trabalhar e não conseguia fazer muita coisa. Fiquei extremamente desanimada, realmente muito abatida. Meu marido sempre me apoiou.
Quando chegava em casa, muitas vezes eu não tinha energia para nada. Estava muito para baixo. Ele me incentivava a não desistir. Houve momentos em que eu falava sobre o quanto estava cansada e o quanto o tratamento era doloroso, e ele sempre vinha me dar encorajamento para seguir em frente.
Meus filhos desempenharam um papel crucial nesse período difícil. Eles percebiam o meu sofrimento e diziam: “Mamãe, estou ao seu lado. Eu te amo, vou te ajudar, não fique triste”. Sempre conversavam comigo, perguntando se eu precisava de algo.
Concluí as sessões de quimioterapia em setembro do ano passado e estava pronta para iniciar a radioterapia e, posteriormente, passar pela mastectomia. Comecei a tomar um medicamento de uso contínuo, que era bastante forte.
O médico me explicou que cada paciente reage de forma diferente. Experimentei náuseas e fortes dores no estômago. No entanto, a medicação era tão intensa que decidi discutir isso com o médico. Achei que os efeitos colaterais estavam relacionados à medicação. Então, ele prescreveu outro medicamento e houve uma melhora significativa.
Após quatro meses, em fevereiro, percebi que minha barriga estava significativamente maior. Ela cresceu de forma repentina, o que me deixou apreensiva. Já fazia algum tempo que eu não menstruava, devido à interferência do medicamento no ciclo menstrual das mulheres. Então, decidi fazer um teste de gravidez, que deu positivo.
No dia seguinte, recebi uma ligação da clínica onde estava sendo tratada para marcar a cirurgia para o câncer de mama. Foi nesse momento que tive que dar a notícia da gravidez. Eles não acreditaram e sugeriram que eu fizesse outro teste, pois poderia haver interferência do medicamento.
Realizei um ultrassom e, na mesma semana, ao receber os resultados, descobrimos que eu estava esperando gêmeos. Um era um menino, e o outro ainda não era possível identificar.
Mostrei os resultados dos exames para o médico e ele expressou sua incredulidade diante da situação. Segundo ele, era considerado impossível que isso tivesse acontecido. Ele me informou que eu teria que refazer as sessões de quimioterapia, caso contrário, minha saúde estaria em risco durante a gestação. Nesse momento, desabei emocionalmente. Pensei: “Meu Deus! Não de novo!” O médico deixou claro que não havia alternativa, pois era uma questão de preservar minha vida.
Retornei ao tratamento e comecei a realizar as sessões novamente. O médico me assegurou que isso não causaria danos aos bebês, o que me trouxe um pouco de tranquilidade. No entanto, as viagens para as sessões eram exaustivas, especialmente com uma barriga tão grande. Eu já estava exausta. Finalmente, concluí as sessões quando estava com 29 semanas de gestação.
Em um outro ultrassom, a médica me disse: “Estou vendo três cabecinhas”. Eu lhe disse que não era possível, que eram apenas dois bebês, e que eu só queria saber o gênero do outro bebê.
Porém, para minha surpresa, havia três crianças. Eram duas meninas e um menino. Fiquei chocada e comecei a questionar se teria forças para enfrentar essa situação. Minha saúde já estava debilitada e o medo tomou conta de mim.
Fui encaminhada para a Santa Casa de Araçatuba, onde fiquei internada por três dias para uma avaliação médica. Graças a Deus, tudo correu bem. Informaram-me que o parto ocorreria na 33ª semana de gestação. Foi um momento difícil para mim, pois estava verdadeiramente exausta. Mal conseguia ficar em pé. Passava a maior parte do tempo deitada. Minha barriga estava enorme e pesada. Havia noites em que eu mal conseguia dormir adequadamente. Era um cansaço que eu não conseguia explicar a origem.
‘Ouvi o choro e desabei’
Quando chegou o momento das 33 semanas, os bebês vieram ao mundo. Foi um parto calmo e extremamente emocionante. Embora estivesse apreensiva com a possibilidade de algo dar errado, tudo correu bem. Ao ouvir o choro das crianças, não consegui conter minhas emoções. Fiquei profundamente tocada e também comecei a chorar. Uma imensa sensação de alívio me invadiu, pois meu maior temor era o momento do parto.
Fiquei hospitalizada por três dias, enquanto os bebês permaneceram na UTI por cinco dias. Quando finalmente puderam vir para casa, senti como se tivesse recebido um presente divino. Eu estava em um momento de grande desânimo, me sentindo para baixo, sem saber o que o futuro reservava para mim e sofrendo intensamente. No entanto, essas crianças trouxeram imensa alegria para minha vida e estou me sentindo muito bem.
Agora, meu plano é me cuidar ainda mais. Sinto uma responsabilidade ainda maior. Quero estar saudável para cuidar deles. Tenho muitos sonhos e objetivos para realizar nesta vida. Além disso, vou retomar meu desejo de obter minha habilitação, afinal, agora tenho mais pessoas em casa que dependem de mim.
Gestação incomum
Fabio Alexandrino Veloso, um oncologista clínico e coordenador do centro de tratamento oncológico da Santa Casa de Araçatuba, explica que é algo incomum uma gestação ocorrer enquanto a paciente está passando por um tratamento contra o câncer.
Segundo o médico, que acompanhou o caso de Jaqueline, a quimioterapia interfere na produção das células reprodutivas e também diminui a produção hormonal, o que reduz as chances de engravidar.
O tratamento do câncer reduz os níveis hormonais e pode causar uma diminuição na produção dos óvulos. Isso interfere significativamente na fertilidade da paciente.
Embora seja raro, ainda é possível que mulheres em tratamento contra o câncer engravidem. Nesses casos, o tratamento continua, porém com precauções adicionais.
O médico destaca que, durante o primeiro trimestre da gestação, é necessário evitar certos tipos de tratamentos, devido ao risco de malformações fetais. Além disso, a amamentação é contraindicada durante o período de tratamento.
Também é essencial analisar cuidadosamente os medicamentos a serem utilizados, uma vez que alguns deles são considerados seguros somente após o primeiro trimestre da gestação.
Fabio Alexandrino Veloso.
A gestação trigemelar, em que três embriões se desenvolvem simultaneamente, é mais comum em pessoas que já tiveram gestações gemelares anteriormente, como ocorreu com Jaqueline.
Todos os casais com capacidade de conceber estão sujeitos a ter uma gestação gemelar, seja de forma natural ou por meio de fertilização in vitro. Existem alguns fatores de risco que aumentam a probabilidade, como histórico familiar de gestações gemelares na linhagem materna, idade avançada da gestante, com mais de 40 anos, e certos procedimentos ovarianos, como tratamentos hormonais, indução de ovulação e técnicas de reprodução assistida.