A tragédia que tirou a vida de quatro membros de uma mesma família em Parnaíba, no litoral do Piauí, chocou o Brasil logo no início do ano. O que deveria ser uma celebração de Ano-Novo se transformou em uma dolorosa lembrança de luto e mistério. Francisca Maria da Silva, de 32 anos, seus dois filhos pequenos — Igno Davi Silva, com apenas 1 ano e 8 meses, e Maria Lauane Fontenele, de 3 anos — além de seu irmão, Manoel Leandro da Silva, de 18, morreram após consumir arroz contaminado com veneno.
Os holofotes agora recaem sobre Francisco de Assis Pereira da Costa, de 53 anos, padrasto das vítimas, que foi detido como principal suspeito. De acordo com a polícia, o veneno utilizado foi terbufós, um agrotóxico extremamente tóxico, restrito ao uso agrícola e proibido para fins domésticos. A venda ilegal dessa substância tem alimentado o mercado clandestino no país, aumentando os riscos para a saúde pública.
Francisco, conhecido pelo temperamento difícil, já expressava publicamente o desprezo por Francisca e seus filhos. Testemunhas próximas descreveram o padrasto como um homem rude, que frequentemente usava insultos como “inútil” e “matuta” ao se referir à enteada. Até mesmo no hospital, enquanto Francisca agonizava, ele teria feito comentários insensíveis. O histórico de desentendimentos entre os dois reforça a tese de que o crime pode ter sido premeditado, motivado por conflitos familiares profundos e persistentes.
O ambiente na casa era marcado por tensão. A residência, que abrigava 11 pessoas, incluía a mãe de Francisca, Maria dos Aflitos, os seis filhos dela e três netos. Segundo os investigadores, o veneno estava armazenado em um baú de madeira, trancado com cadeado, próximo ao fogão — um espaço de acesso restrito a Francisco. Esse detalhe levanta sérias questões sobre como a substância mortal foi introduzida na comida.
O comportamento do suspeito durante os depoimentos só aumentou as desconfianças. Em suas declarações à polícia, Francisco inicialmente afirmou que não tinha tocado na panela de arroz, mas depois admitiu o contrário, para em seguida voltar atrás. Essas contradições contribuíram para reforçar a teoria de seu envolvimento direto no crime.
Outro ponto que intriga os investigadores é o fato de Francisco ter consumido o mesmo arroz contaminado sem apresentar sintomas graves. Essa peculiaridade levanta a hipótese de uma possível autointoxicação planejada para confundir as autoridades. Se confirmado, esse detalhe indicaria um nível preocupante de premeditação.
Durante as buscas na residência, os policiais encontraram materiais adicionais que ampliam o escopo da investigação. Revistas de temática nazista estavam entre os pertences de Francisco, junto a celulares e documentos que agora passam por perícia. A descoberta levanta questões sobre possíveis motivações ideológicas ou cúmplices ocultos.

Outro desafio para os investigadores é entender como o suspeito adquiriu o terbufós. A venda dessa substância exige um rigoroso controle, incluindo registro e treinamento especializado. No entanto, no Brasil, o comércio clandestino de agrotóxicos cresce à sombra da fiscalização insuficiente, colocando vidas em risco.
O caso de Parnaíba, além de expor o impacto devastador de conflitos domésticos mal resolvidos, também lança luz sobre a urgente necessidade de combater o mercado ilegal de produtos tóxicos. Com uma investigação ainda em andamento, familiares e a sociedade aguardam respostas claras sobre o que levou à tragédia que destruiu uma família inteira.
A história lembra tragédias anteriores no país, como o caso de 2019, em Barueri (SP), quando uma mulher envenenou parentes usando um suco contaminado por raticida. Situações assim revelam como venenos podem se tornar armas silenciosas em meio a relações marcadas por violência psicológica e desamor.
Cada detalhe dessa investigação, da origem do veneno aos motivos pessoais do suspeito, trará lições amargas sobre segurança, comércio ilegal e a fragilidade das relações humanas. Enquanto isso, o luto dos que ficaram permanece como um lembrete pungente de que, muitas vezes, o perigo se esconde dentro de casa.